Nota de Repúdio à postura do Presidente da República frente às medidas de enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus – COVID19

04/05/2020 14:13

Florianópolis, 4 de maio de 2020

Como entidade universitária e científica o GPPS tem o dever de desenvolver e compartilhar conhecimento e opiniões fundadas nos estudos científicos e valores éticos que devem nortear as políticas públicas voltadas para a saúde e o bem estar social. Por isso, vimos a público manifestar nosso repúdio à forma como o Sr. Presidente da República vem tratando o plano de contingência para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus (covid-19), justificando nosso repúdio a seguir.

O plano de contingência, seguindo as orientações da Organização Mundial da Saúde, recomenda isolamento social, o que inclui abolição de aglomerações e distanciamento físico entre as pessoas a fim de garantir a prevenção do contágio pelo vírus. Há inevitavelmente cessação temporária ou adequação de diversas atividades que afetam comércio, indústria e a mobilidade urbana, medidas vistas como absolutamente necessárias para proteger a saúde da população.

O Senhor Presidente da República, entretanto, vem reiteradamente manifestando-se contrário a estas medidas, conclama a população a sair às ruas e, ele mesmo, junto com alguns de seus ministros e assessores, tem desrespeitado o plano governamental, saindo às ruas, promovendo aglomerações e transgredindo as regras de distanciamento entre as pessoas, chegando ao contato físico e colocando assim em risco sua própria saúde, a de seus acompanhantes, a do público com que entra diretamente em contato e, contingencialmente, da população como um todo. É agravante o fato de o Presidente ter tido contato direto com muitas pessoas que fizeram parte de uma comitiva de viagem aos Estados Unidos e foram testadas positivamente para o vírus. Embora o Presidente alegue ter testado negativamente, medidas de cautela de sua parte seriam imperativas. Em pelo menos uma situação de contato com o público o Presidente fez-se acompanhar de um ministro que deveria estar, à ocasião, em isolamento, levando o risco a todos os presentes.

Governantes de qualquer nível e de qualquer dos três poderes não têm direito à desatenção, negligência ou ataque à Saúde Pública e ao bem estar da população. As autoridades sanitárias, particularmente o Ministério da Saúde, têm o dever de produzir, proteger, cuidar e promover a saúde coletiva e não podem ser coniventes com comportamentos contrários a esta missão.

O Presidente defende propostas como a volta irrestrita à “normalidade”, ou seja, a volta ao funcionamento de comércio, da indústria e o restabelecimento do padrão usual da vida cotidiana; afirma que a pandemia não é grave, chegando a classificá-la como “gripezinha”; que a contaminação de 70% da população seria positivo para o combate à pandemia; e um ”isolamento vertical”, em que somente idosos e pessoas com doenças crônicas ficariam isoladas.

Estas propostas não têm respaldo científico, são rejeitadas pelas autoridades sanitárias internacionais e nacionais e revelam um grau de ignorância inaceitável sobre as formas de contágio. A ignorância, neste caso, é fator de risco para a Saúde Pública e incompatível com o cargo de Presidente da República, que tem obrigação de informar-se ao máximo sobre assunto de tamanha importância. As populações dos países que subestimaram a gravidade desta pandemia estão pagando um altíssimo preço em vidas e sofrimento.

Todos os líderes mundiais estão tomando ações contra a proliferação do novo corona vírus. Estudos apontam que as ações governamentais promovendo medidas de cuidado e prevenção devem ser firmemente implantadas para que tenham o máximo de efetividade, eficácia e eficiencia. A maioria dos líderes dos países ocidentais, independente de orientação ideológica, tem exercido uma liderança que visa responder diretamente a estas orientações. No Brasil precisamos urgentemente que os três poderes se alinhem em todos os níveis para a superação da pandemia com um mínimo de prejuízo para a Saúde da população e para a Economia.

O pronunciamento do Presidente da República em rede nacional, de 24/3/2020, fomentou uma sinalização de relaxamento das medidas de isolamento, por parte de alguns Governadores e Prefeitos. Já é possível verificar que uma parte mais que desejável da população tem abandonado o isolamento, o que, acreditamos, ocorre em resposta às reiteradas incitações do Presidente para que as pessoas voltem às ruas. O fato é extremamente grave e demonstra, mais uma vez, que há uma desconexão entre os saberes produzidos e defendidos pelas autoridades científicas e sanitárias internacionais e nacionais e o Poder Executivo federal, compartilhada por alguns poderes governamentais em nível estadual e municipal.

Seguiram-se outros fatos igualmente graves, como o compartilhamento de notícias falsas sobre desabastecimento de produtos alimentícios em Minas Gerais, em 1/4/2020, fato que potencialmente poderia levar pânico à população. E a entrevista à rádio Jovem Pan, de 2/4/2020, em que o Presidente ameaça os outros poderes da República com a promulgação de um decreto com fins de extinguir todas as medidas de proteção até aqui realizadas sob a égide do Ministério da Saúde. Estes fatos não só constituem ataque à Saúde Pública como criam uma desestabilização e incitam discórdia entre poderes e na sociedade como um todo. São, por isso, inaceitáveis, especialmente advindos do Poder máximo da República que deveria, ao contrário, transmitir serenidade para que todos possamos lançar mão das forças disponíveis para enfrentar tão grave situação.

Assim, O GPPS manifesta seu REPÚDIO e solicita às autoridades governamentais em todos os níveis, Ministérios e outras instâncias de poder administrativo a cumprirem sua missão de proteger de forma inegociável e irredutível a Saúde Pública e o bem estar da população brasileira.

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O GPPS assina também o manifesto da comunidade catarinense, repudiando a relaxamento do isolamento social em Santa Catarina.

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